terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O amor de Jules (uma reflexão sobre o amor)


Já faz um bom tempo que minha pretensiosa, perturbada e questionadora mente pensa a respeito do mais complexo dos sentimentos. Depois de concluir que “não vai haver amor nesse mundo nunca mais” (dá-lhe Marceleza), passei a tentar compreender primeiro o que é o amor, para, finalmente, buscar compreender porque ele não existe mais. (É preciso deixar claro que o amor aqui discutido é o que supostamente ocorre entre casais de namorados, etc. Excluí-se, então, obviamente, o que acontece de pai para filho, de neto para avó, entre amigos, etc.)
Assistindo ao filme “Jules et Jim” (Jules e Jim – Uma mulher para dois, François Truffaut, França, 1962), encontrei um verdadeiro exemplo de amor, no sentido mais puro, verdadeiro e sincero da palavra; Jules, interpretado de forma simples, porém intensa, pelo ator Oskar Werner. Vale lembrar que esse amor ocorre apenas na ficção, o que não tira dele o título de “amor verdadeiro”
O filme: a belíssima e cativante Catherine (Jeanne Moreau) casa-se com Jules, que traz seu amigo de infância, Jim, para morar com ele e com sua esposa. Recém casados, já fazem um filho, que nasce enquanto a dupla de amigos está lutando na guerra. A mulher cria a filha sozinha, enquanto troca cartas apaixonadas com seu amado. Quando voltam do combate, a esposa passa a distanciar-se cada vez mais de Jules, confidenciando a Jim que seu marido voltara muito mudado da guerra. Jules, na verdade, venerava cada vez mais sua esposa. Jim e Catherine ficam cada vez mais próximos e íntimos, até que ela resolve trocar de par. Enquanto Jules brinca com a filha, sua esposa transa com seu grande amigo, na mesma casa.
A partir daqui, o filme deixa de ser simplesmente um roteiro bem feito filmado por um diretor competente, para entrar para a história como um dos maiores filmes já produzidos. A genialidade e grandiosidade de um, à época, jovem cineasta. Truffaut nos tira do lugar comum e comprova a frase de apresentação do DVD: “O melhor filme já feito sobre o amor”. Podemos pensar que Jules vai matar os dois traidores (não chamaremos mais assim), que ele vai embora revoltado ou que vai brigar e infernizar a vida dos dois. Nada disso ocorre. Ele segue amando, admirando e venerando sua deusa, além de respeitar a decisão dela. Isso é amor. Em uma conversa franca, Jim acusa Jules de tratar Catherine como uma rainha. A resposta vem com um sorriso puro, através de uma voz tranquila: “mas ela é uma rainha”.
Se observarmos com um olhar desatento, podemos considerar a obra uma “putaria” ou até mesmo a classificarmos como um simples triângulo amoroso. Mas não é assim, milhões de vezes, NÃO.
Quem ama de verdade não precisa provar, pode viver tranquilo, desde que seu(sua) amado(a) esteja feliz e em paz. O Jules amava, de fato. Aceitou ser trocado, pois percebeu que, no momento, Catherine achou que ele não era a melhor opção para ela. Além disso, serviu de amigo e conselheiro, quando Jim fugiu sem deixar notícias. Ele teve chance de transar com ela na ausência do amigo, mas não o fez, visto que sempre respeitou, a cima de tudo, seu verdadeiro amor.
Quem ama, cuida, protege, suporta, dá carinho, faz rir. E só. Não questiona, não prende, não expõe, não mente, não oculta. E digo mais: o amor verdadeiro é traído, mas aceita. Enquanto o lugar comum chama de corno, eu chamo de amor inabalável, simplesmente amor. Se for diferente disso, não é amor.
Se eu sinto ciúmes, o sentimento ridículo é meu e eu tenho que dar um jeito nele. A pessoa que está comigo não tem culpa nenhuma e nem precisa ficar sabendo. Ter ciúmes deveria deixar a pessoa envergonhada.
Após compreender o que é amor, a mais nova conclusão é que ele não passa de um horizonte inalcançável, um delírio daqueles que só a mente humana mais doentia pode acreditar.
            O fato de o verdadeiro amor ser inalcançável para a mesquinhez humana não redime os outros sentimentos menores, elevando-os ao status de amor. Assista “Jules e Jim” e cuide-se, por favor, para não cair no lugar comum.

"Não vai haver amor nesse mundo nunca mais."