segunda-feira, 20 de maio de 2013

Dentro da noite

A noite está começando.
Os casais saem de mãos dadas.
As luzes brilham na esquina da João Alfredo.
Os jovens vão à Rua da República cheios de vida e de esperança.
Na imaginação deles, emoção e prazeres.
Conhecer pessoas novas, ficar com várias.
É a melhor fase da vida. É preciso curtir ao extremo.
Ficar em casa sábado? Jamais.
Na fila, olhares atentos em busca de rostos bonitos.
Copo em uma na mão, celular na outra.
As garrafas vazias começam a tomar conta da mesa.

Quando levamos a garota dos sonhos para a noite, ela cai após algumas doses e acabamos ficando como o amiguinho gentil que a carregou e levou aguinha.
Cadê ela, “além de aqui, dentro de mim?” (desculpa, Renato Russo)
Moreno, alto e magro, com camiseta branca e calça skinny, com sotaque carioca. Nunca mais o viu.
Se ela tivesse falado com ele, teria sido o homem da vida dela. Mas todos com quem falou a decepcionaram.
Apegamos-nos às pessoas e, quando menos esperamos, elas desaparecem das nossas vidas antes que o gosto do vinho que bebemos com elas tenha sumido da nossa boca.
"O rock morreu? Não aqui." As minhas esperanças morreram, mas meu corpo ainda não entendeu. Sigo procurando a garota ao meu lado na cama.
Também continuo imaginando que ela está sentada comigo no cinema nas tardes de chuva.
Aquela blusa transparente desperta a minha imaginação e me lembra do tempo em que eu ainda era um homem.

A noite está acabando.
A última banda vai subir no palco do Opinião.
Não sou mais o mesmo.
Meu grande melhor amigo e eu bebemos água sem gás em vez de vodka.
Já não somos tão jovens assim.
Uma fase está acabando.

Ela engravidou e teve que conseguir emprego.
Agora terá que abandonar as festas do Chalaça.
O pai do filho dela segue bebendo e curtindo outras meninas.
Era exatamente esse final que ela sonhara quando eles se conheceram na Cidade Baixa, há um ano.
A esquina segue a mesma, o D.J ainda faz os boêmios dançarem na Independência, mas a esperança já se foi, juntamente com o calor das noites de verão.

Decote provocante, botas e calça justa. Morena.
Tênis, bermuda , camiseta do Jack Daniels e cabelos longos. Rapaz carioca, poeta e cantor.
Abraçados e trocando carícias na saída da noite.
Amor?
Não. Porque ele não existe.
Sim. Porque quase todos querem que seja.

As PESSOAS (parte II)

Se você preferir, pode ler antes a primeira parte.

As PESSOAS postam no facebook fotos de sua infância no dia das crianças.
As PESSOAS conquistam umas às outras para depois desprezarem seus conquistados para, dessa forma, alimentarem seus egos.
As PESSOAS não mostram sua verdadeira personalidade com medo do julgamento das outras PESSOAS, que, por sua vez, também se escondem.
As PESSOAS fazem o sinal da cruz quando passam por igrejas sem saber o motivo.
As PESSOAS votam “na pessoa, não no partido”.
As PESSOAS presenteiam no dia das mães, mas a xingam por qualquer besteira.
As PESSOAS assistem filmes brasileiros somente após o reconhecimento do exterior.
As PESSOAS criticam o Brasil, mas nada fazem para mudar.
As PESSOAS jogam lixo no chão.
As PESSOAS criticam as novelas, mas assistem sempre.
As PESSOAS crescem, casam-se ou “juntam-se”, têm filhos e conseguem um emprego considerado bom por todas As PESSOAS, sem nem mesmo pensar por que estão fazendo isso.
As PESSOAS estudam direito para dizerem “eu sou advogado”, o tempo todo, sem serem perguntados sobre isso.
As PESSOAS ficam duas décadas sem ver um amigo, mas vão chorar no velório dele.
As PESSOAS mudam de personalidade por terem alcançado uma melhor posição social.
As PESSOAS passam a gostar de um esporte só por que ele tornou-se popular.
As PESSOAS dirigem após beber.
As PESSOAS acreditam em tudo que veem na televisão.
As PESSOAS gostam de cinema só na época do Oscar; de futebol, em tempos de Copa do Mundo e de arte, durante a Bienal.
As PESSOAS reclamam do desemprego e depois de serem contratadas não querem trabalhar.
As PESSOAS veem um caso de corrupção na televisão e começam a se revoltar e se indignar contra o político, inclusive defendendo a prisão dele, antes mesmo de tentar entender o assunto.
As PESSOAS não gostam de eleições.
As PESSOAS preferem votar em qualquer um a pensar um pouquinho antes de escolher o candidato.
As PESSOAS são preconceituosas com jogadores de futebol, com loiras, com roqueiros, com ricas, com pobres, com bonitas, com feios, com usuários de drogas, com homossexuais, mas se dizem contra o preconceito, só por esse discurso estar na moda.

O problema não é tomar essa ou aquela atitude, mas agir sem pensar, baseando-se somente nas opiniões de outras PESSOAS. As PESSOAS representam o pensamento geral, o lugar comum, a sociedade de massa, aquela que pega a onda sem saber para onde está sendo levada, mas não aceita, jamais, deixar de participar e de concordar com a maioria. Talvez eu seja, sim, uma delas.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Brasil - Amor e ódio

O Brasil é nosso. Mas só quando convém. Se o assunto for futebol, como é bom dizer: sou brasileiro. Senadores e deputados são todos corruptos. Criticamos, mas, na hora de votar. Ah, na hora de votar vamos o mais rápido possível para nos livrar. Ou como bons brasileiros, chegamos poucos minutos antes do fechamento da seção. Essas são as nossas preocupações em dia de eleição. Ir pela manhã ou pela tarde? Depois ou antes do almoço?

Agora, estamos orgulhosos da solidez da nossa economia, ouvimos nosso ex-presidente dizer que emprestou dinheiro ao FMI e que o desemprego está cada vez menor. A presidente Dilma Rousseff anda sendo parabenizada em todos os lugares que vai. O país da Garota de Ipanema. Que orgulho! Aliás, lá fora, duas versões da canção são conhecidas. Ambas cantadas em inglês. A primeira interpretada pela baiana Astrud Gilberto e a segunda, pelo americano Frank Sinatra.

Coitado do Brasil. Esse país foi criado por alguém bem criativo. Um gênio que conseguiu imaginar todos os minuciosos detalhes. Esse estudioso segue brincando com seu mais ousado projeto. Não deve ser fácil inventar uma pátria que escraviza seus índios e impõe o catolicismo a eles. Mas eles já não tinham religião? Acho que os livros falam algo sobre isso. Por falar em livros, os europeus leem, em média, nove livros por ano. Aqui, não lemos nem a metade disso.

A maior nação da América do Sul tem uma grande miscigenação, mas mesmo assim tem incontáveis e lamentáveis casos de racismo. Quase todos assistem novela, mas a maioria tem vergonha disso. Os portugueses não têm, pois importam nossos folhetins sem pensarem duas vezes.E sempre atingem o sucesso. Acredito já ter ouvido alguma piada sobre portugueses por aqui. Eles são burros, não são? Por falar nisso, tenho vontade de rir quando lembro que quase todo mundo já esteve preso a uma trama da Rede Globo, daquelas bem fáceis de adivinhar o final. Não, o engraçado não é se apegar a um enredo bem feito, mas acompanhar toda a obra e depois falar mal de quem assistiu.

Brasil, como não amar e como não odiar? A melhor decisão é desistir de concluir algo, apenas sentar em frente à televisão, comprar uma cerveja e aproveitar essa oportunidade única da vida, que nos permitiu nascer brasileiros. Abraços a todos os conterrâneos. Daqueles bem apertados, que somente nós sabemos dar.